Quando problema de memória e “esquecimento” pode ser positivo para o cérebro?
Há algum tempo os neurocientistas sabem que as mesmas áreas do cérebro são recrutadas tanto na memória quanto para elaboração da imaginação. Acredita-se que a nossa capacidade de pensar retrospectivamente sobre o passado está, de alguma forma, vinculada à capacidade de pensar prospectivamente sobre o futuro.
A memória desempenha um papel extenso em todas as etapas do processo criativo. Primeiro, exercendo sua função adaptativa, a memória permite planejar, ou imaginar não apenas o futuro, mas também é através dela que criamos perspectivas sobre o presente.
"Tempo presente e tempo passado. São ambos talvez presentes no tempo futuro" (T.S. Eliot)
Nesse processo de planejamento, a memória funciona como um simulador no cérebro, fornecendo o combustível para nossa viagem mental no tempo. É aí que "falhas" favorecem o processo criativo.
Se você não se lembra de tudo, vai precisar preencher as lacunas. Esse processo é dinâmico e automático: a memória evoca experiências armazenadas que retorna cheio de lacunas e imediatamente a imaginação vai preenchendo essas lacunas para ligar os fatos lembrados. Lembrar mal e esquecer permitem a flexibilidade cognitiva exigida pela imaginação.
Esta simulação baseada em memória e imaginação possibilita produzir soluções criativas para uma miríade de problemas.
Mas como o cérebro humano define o deve registrar e o que pode ser esquecido?
Na realidade, a primeira coisa que fazemos com a maioria das informações que recebemos sobre o mundo é esquecê-las, pois quase nada vale a pena manter.
Para memorizar voluntariamente uma informação ou atividade que nos seja útil, procuramos repeti-la várias vezes ou ensaia-la. Alguns eventos se repetem naturalmente ao longo do tempo e com a repetição involuntária de uma mesma experiência também leva à memorização. Por exemplo, ao fazermos diariamente o mesmo trajeto de ônibus, memorizaremos o itinerário.
Ainda assim, nem todas as informações armazenadas são úteis. Algumas coisas ficam registradas na memória porque estão fortemente conectadas a emoções, como admiração, susto ou medo. A emoção funciona para o cérebro como um sinalizador de que a informação é algo muito importante para a sobrevivência.
Considera-se três tipos de memória:
A memória icônica, ou visual, é a mais curta. Quando olhamos para uma cena ou objeto e depois rapidamente fechamos os olhos ou desviamos o olhar, a imagem fica retida na mente por algum tempo. Esse tempo é suficiente para que possamos trabalhar com essa memória. Por exemplo, um caminhão baú passa rapidamente por você e logo em seguida você telefona para o número de telefone que estava anunciado na carroceria dele para contratar o serviço da empresa. Geralmente são informações que não valem a pena manter armazenadas para sempre.
A memória de longo prazo armazena tudo que aprendemos e precisamos lembrar amanhã, no dia seguinte ou daqui a 10 anos. O processo de registro se dá pela repetição, ou "ensaio". Ou seja, se repetirmos várias vezes o número de telefone que vimos rapidamente na carroceria do caminhão, passaríamos a armazená-lo na memória de longo prazo por horas ou até mesmo para o resto da vida.
Podemos exercitar esse processo de registro criando padrões de repetição para que as informações presentes regularmente em nosso ambiente sejam armazenadas mais rapidamente. Assim trabalham os atores, por exemplo, acostumados a decorar os longos diálogos dos personagens que precisam interpretar; ou também os garçons que se acostumam a decorar inúmeros pedidos complexos de vários clientes. Esse processo de registro envolve estruturas complexas de memória.
A o registro na memória de longo prazo torna-se ainda mais fácil se o processo envolver compreensão conceitual. Palavras são mais facilmente memorizadas quando classificadas em categorias do que quando são apresentadas aleatoriamente, por exemplo. É aqui que a imaginação atua novamente, criando suposições para preencher as lacunas na formação do conceito que envolve o fato na memória.
👉 Commun Biol. 2022 Jun 16;5(1):604
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